O Aikido não é uma religião, mas sim um processo de educação e refinamento espiritual. Você não será convidado a aderir a nenhuma doutrina religiosa, somente a manter-se espiritualmente aberto. Quando nos curvamos em reverência não se trata de uma cerimônia religiosa, mas de um sinal de respeito pelo mesmo espírito da inteligência criativa universal que está dentro de todos nós.
A cerimônia de abertura e encerramento de cada aula de Aikido é uma saudação formal em direção ao shomen (parte frontal do tatami, onde encontra-se a foto do Fundador), seguindo-se duas palmas e novamente outra saudação ao shomen e então uma saudação entre o instrutor e os alunos. As saudações em direção ao shomen simbolizam o respeito pelo espírito da natureza, pelos princípios do Aikido e gratidão ao Fundador pelo desenvolvimento deste sistema de prática e estudo. As duas palmas simbolizam unidade, musubi. A primeira palma envia a nossa vibração ao mundo espiritual. A segunda recebe o eco dessa vibração e une o seu espírito com o espírito do Fundador e com a Consciência Universal. A vibração emitida e o eco recebido são ditados pelas suas próprias crenças espirituais e atitudes.
Não há modo certo ou errado no Aikido. Se um movimento obedece as leis físicas do universo, está correto. Se você obedece às leis físicas do universo, a sua atitude deve estar correta. Ao seguir estas leis você está seguindo o Caminho de Deus. Portanto, o Aikido não é um treino técnico. É um treino de sabedoria.
Não há kata individual no Aikido porque Aiki é a harmonia das relações. Num dojo de Aikido se pode encontrar pessoas de diferentes níveis sociais, diferentes culturas e linguagens, diferentes filosofias políticas e religiosas. Elas não estão juntas para competir ou para pressionar as suas próprias idéias sobre quem quer que seja, mas para aprender a escutar mutuamente, a comunicar através do contacto do Aikido. No tatami onde treinamos não podemos esconder a nossa verdadeira identidade. Mostramos as nossas fraquezas tão bem quanto as nossas forças. Suamos juntos, cansamos juntos, ajudamos um ao outro e aprendemos a confiar. Estamos todos estudando os mesmos princípios universais e a essência, que é a mesma em cada um, torna-se brilhantemente clara fazendo desvanecer a máscara de insegurança e o ego. Somos todos indivíduos, mas também somos parte uns dos outros. Se estivéssemos sozinhos no Universo sem ninguém para conversar, ninguém com quem compartilhar a beleza das estrelas, para rirmos juntos, para tocar, qual seria o propósito da vida? É uma outra vida, é o amor, que dá significado à vida. Isto é harmonia. Devemos descobrir a alegria de cada um, a alegria dos desafios, a alegria do crescimento.
No treino do Aikido não se vence. Ao tentar vencer perde-se. Encarar o treino como uma competição levará à derrota, o seu parceiro de treino perde, todos perdem. Se você encara a vida como uma competição, você não pode vencer, pois conseqüentemente morrerá. Mas se encarar a vida como um processo de criatividade universal, nunca morrerá, pois faz parte deste processo. Se você encarar o crescimento do seu corpo e da sua mente como um prelúdio para um crescimento espiritual, a força durará para sempre.
Uma mente voltada para desafios não é uma mente voltada para competição. O maior desafio é desafiar-se a si próprio. Não devemos passar a nossa vida inteira procurando pela segurança. Cobrir-se de camadas e camadas de pesadas armaduras tornará você incapaz de se mover, incapaz de lutar e de proteger a si e aos outros. Nunca poderá sentir o toque quente do sol nem a força de uma tempestade sobre a pele. A alegria desvanecer-se-á. A sua liberdade e a independência perder-se-ão.
Se passar a vida na segurança de uma caverna ao pé da montanha, veráunicamente a escuridão. A sua experiência será limitada e você nuncasentirá a doce dor do crescimento. Deverá deixar esta proteção e segurança e desafiar-se a si mesmo nas altas montanhas. Deve escalar cada vez mais alto, elevando a sua visão, a sua habilidade e experimentar expandir-se a cada topo. E estando aberto e desprotegido do vento, com o sol e a neve tocando o coração, experimentará o grande panorama do universo inteiro ao seu redor. Irá alcançar e tocar galáxias e quem sabe, tocar a face de Deus.
Bushido (que pode ser traduzido como “código dos guerreiros” ou “caminho do guerreiro”) é feito de desafio e sacrifício. É o poder e a força de um espírito independente. Um espírito dependente é fraco e não consegue sacrificar o seu próprio egoísmo e a sua ganância. Para ser verdadeiramente independente e provar o desafio da liberdade, o espírito deve estar vazio. Numa análise final, você e somente você é o responsável pelo seu próprio crescimento. Você cria a sua própria realidade.
Você sente a dor, você sente o medo, mas está intensamente vivo. Escalando uma montanha de gelo, com frio, faminto, exausto, você está só com o som do vento. Desista e morre. Talvez um passo, talvez uma polegada por dia, mas tente. A vida é a mesma coisa. Às vezes com frio, com fome, e sozinho. Você deve depender exclusivamente de você. Isto é Bushido. Este é o meu mundo do Aikido. A busca pelo topo das montanhas.
Texto tirado do livro “Aikido and the Harmony of Nature” do Shihan Mitsugi Saotome
